Me tornar uma mulher adulta está sendo mais difícil do que eu pensava. Os conflitos mundiais, a pandemia, os estudos e a saúde mental são alguns dos tópicos que tiram meu sono quando deito a cabeça no travesseiro, e claro… é inevitável. Como esperar que alguém em pleno 2021 não tenha dificuldades para dormir? Uma vestibulanda então… nem se fala. Mas, ultimamente, tenho me deparado com uma realidade que ninguém me preparou, talvez por ser tão comum no cotidiano das mulheres: meu corpo não é meu.
Vivendo num país que não legaliza o aborto, é muito difícil não se sensibilizar com as atuais notícias do Texas, nos Estados Unidos. Mais uma vez, homens se sentem no direito de controlar o corpo da mulher, impondo uma realidade que não existe. E não posso negar, essa situação me dá muita raiva. Não só pelo fato de serem políticos querendo fazer política às custas da mulher, impondo ideais “cristãos” e “moralmente corretos” para receber apoios dos “republicanos tradicionais”, mas também porque ninguém se dá ao trabalho de entender como o nosso corpo funciona. Inicialmente, quando alguém decreta que uma mulher tem 2 semanas de menstruação atrasada para decifrar que está grávida, fica claro que faltam conhecimentos básicos sobre o corpo humano feminino. É praticamente impossível que uma mulher desconfie de uma gravidez simplesmente pelo fato de estar com a menstruação atrasada. Estresse, hormônios alterados, doenças e alimentação são alguns dos MUITOS fatores que influenciam – e atrasam – a menstruação. E ISSO DEVE SER CONHECIMENTO BÁSICO DE QUALQUER PESSOA, MAS PRINCIPALMENTE DAS QUE DECIDEM O “PRAZO DE VALIDADE” QUE A MULHER TEM PARA TOMAR UMA DAS DECISÕES MAIS DIFÍCEIS DA VIDA DELA.
Assim, chego ao meu segundo motivo de indignação: o que passa na cabeça de alguém – e pior, um HOMEM – para se sentir no direito de controlar o corpo da mulher? Meu Deus do céu, nós estamos falando de uma mulher, uma pessoa que tem uma vida, de uma ser humano que habita a Terra e vive sua própria realidade. Como alguém se acha mais capaz de julgar o que é melhor para essa mulher do que ela própria? Existem tantos motivos para que um aborto aconteça. Motivos pessoais que só entende quem vive, peculiares e individuais. Um estupro, uma relação abusiva, uma doença, condições financeiras, falha do método contraceptivo, decisões precipitadas… são tantos casos… tantas realidades invalidadas por pessoas que nem tem conhecimento sobre biologia básica. É muito frustrante.
Ainda, não podemos esquecer da tremenda hipocrisia que define essa situação, uma vez que a criminalização do aborto não elimina a prática. Não é muito difícil entender que criminalizar algo não erradica o problema. Roubar é crime, mas as pessoas ainda roubam. Bullying é crime, mas nas escolas é o que mais tem. Racismo é crime, mas é só olhar um site de notícias para entender que ainda existem pessoas racistas no mundo. Assim, é inviável acreditar que essa decisão vai ser obedecida. Além do mais, a criminalização é tão inútil quanto perigosa, já que a falta de dinheiro e informação levam mulheres a ocorrerem por clínicas clandestinas, e quem tem dinheiro consegue burlar o sistema e ter um aborto em clínica particular, com assistência médica. A Folha de São Paulo reportou que “Descriminalizar o aborto -num primeiro momento- e legalizá-lo em seguida, derrubaria o número de interrupções da gravidez e reduziria a quase zero as sequelas e as mortes pelo aborto clandestino. Segundo dados das Nações Unidas, 70 mil mulheres morrem por ano em decorrência de complicações do aborto”.
Ademais, a ideia disseminada pelos que são contra o aborto é extremamente ignorante e distorcida. Eles fazem parecer que as mulheres querem abortar, que usam o aborto como método contraceptivo, que são assassinas e não se importam com a vida, que encaram essa situação como algo comum e cotidiano. NÃO É ASSIM QUE FUNCIONA. Quem, em plena consciência, fica feliz por abortar? Apesar de ficar feliz por ter o direito de controlar o próprio corpo e ter segurança ao fazer isso, é de extrema crueldade pronunciar que é algo banal para a mulher. Não é. Não interessa o motivo, aborto é algo sério, e principalmente quando legalizado, traz muito conhecimento e consciência sobre o assunto, o que, de certa forma, valida ainda mais a decisão, pois, se a mulher tiver conhecimento de todo o processo e consequências, e ainda quiser abortar, É PORQUE ELA REALMENTE PRECISA.
Contudo, eu venho aqui como mulher, pedir às pessoas – principalmente homens – que parem de controlar realidades que jamais conseguirão entender, e que parem de incriminar as mulheres que tomam decisões difíceis, mas necessárias para o próprio bem. Ser pró-vida é priorizar a vida de quem já está aqui, de quem tem sonhos, de quem tem experiências. Não é sobre abortar. É sobre a mulher ter a opção de tomar decisões por ela, sobre ela. É sobre impedir que homens usem as mulheres para fazer política que não as favorecem. É sobre ter direito à saúde e segurança. É sobre inibir que ideais religiosos controlem o corpo feminino. Por favor, parem de tentar controlar o nosso corpo. Parem de tentar controlar nossas vidas. Parem de nos considerar incapazes de tomar decisões. Parem de banalizar nossas histórias. Parem de transformar nosso gênero em maldição.
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