É difícil por em palavras as experiências que eu tive. Estudei em 6 escolas diferentes e sofri bullying em quase todas elas. E como se não bastasse, não foi só em escolas, mas aulas de dança e outras atividades. Muitas pessoas sofrem bullying, mas poucas realmente entendem o que é passar uma vida toda sendo perseguida por esse crime.
Uma vez, quando eu tinha 8 anos, uma menina que fazia aula de dança comigo me deu parabéns no halloween, dizendo que era o meu dia, já que eu era uma bruxa. Quando eu tinha 11 anos, um menino que estudava comigo perguntou pra mim – na frente de todos os alunos da nossa classe – o motivo de eu ser tão gorda. Me mudei para uma escola diferente com 13 anos e no meu primeiro dia de aula uma menina da minha sala fez um grupo no WhatsApp com todas as meninas da sala, pedindo para que todas me excluíssem, usando todos os animais existentes na face da terra para se referir a mim. Com 15 anos, um outro valentão começou a me chamar de Willy Wonka, pois meu cabelo era parecido com o do personagem. Pouco tempo depois de completar 16 anos, uma “amiga” espalhou várias mentiras a meu respeito, fazendo com que os boatos chegassem em outras classes, e eventualmente, em outras escolas. E isso não é nem 1/100 das histórias.
Nunca me defendi. Nunca tirei satisfação com os valentões. Nunca processei essas pessoas, algo que poderia ter feito caso quisesse. E aguentar tudo isso calada… foi DIFÍCIL.
Eu guardei muito dentro de mim. Muitas emoções, muita mágoa, muita insegurança, muita tristeza. E não teve como… isso tudo teve um impacto gigante na minha saúde mental e física. Fui diagnosticada com ansiedade. Meus níveis hormonais estavam todos alterados. Com 16 anos eu estava no fundo do poço. Mas pouquíssimas pessoas sabiam, pois não queria me mostrar frágil ou vulnerável. Obviamente minha família sabia de tudo que acontecia, apesar de eu não mostrar o quanto me afetava. E isso claramente abalou todos eles. Minha mãe. Meu pai. Meu irmão. Meus avós. Meus tios e tias.
Por muito tempo, tudo que eu mais queria na vida era chegar para todos que faziam essas maldades comigo e falar “e se alguém estivesse fazendo com a sua irmã o que você está fazendo comigo?” ou “olha aqui o diagnóstico da psiquiatra” ou “olha a receita médica com a lista enorme de remédios que eu tenho que tomar para que o meu corpo consiga acompanhar meu nível de estresse” ou “você sabia que ontem à noite minha mãe foi me dar ‘boa noite’ e me viu chorando, e quando descobriu o motivo das lágrimas, chorou comigo?”. Mas convenhamos… se eles se importassem com o próximo, não teriam feito o bullying pra começo de conversa.
Então, eu, passando por essa situação por um longo período de tempo e guardando tudo dentro de mim, passei a acreditar no que falavam para mim e sobre mim. Quando falavam que eu era feia e parecia o Willy Wonka, eu acreditava. Quando falavam que eu não tinha amigos e ninguém se importava comigo, eu acreditava. Quando falavam que eu era o motivo de uma escola ir à falência, eu acreditava. Quando falavam que eu nunca seria alguém na vida por ter TDAH, eu acreditava. E não só isso, mas, como muitos “amigos” acabavam virando as costas pra mim depois de algum tempo de amizade, eu achei que nunca seria capaz de ter os mesmos amigos por mais de 1 ano.
Essa situação me corroeu. Minha autoestima era inexistente. Eu não conseguia confiar em ninguém ao meu redor, nem mesmo familiares. Eu não me sentia merecedora de nada que conquistasse. Minhas notas na escola estavam péssimas. A minha relação com a minha familia não estava boa. Eu não tinha vontade de fazer nada.
Eu não sei se alguém já te contou isso, mas ter TDAH e passar por tudo isso não é uma boa pedida. Essa soma vira uma grande bola de neve sem controle e acaba afetando todos os aspectos da vida. E foi aí, no subsolo do poço, que eu procurei ajuda profissional. Comecei a fazer terapia uma vez na semana. E NOSSA… como esse processo é brutal. Analisar cada ocorrido, reviver os momentos mais dolorosos, sentir todas as emoções… BRUTAL, mas necessário. E quando eu menos esperava, semanas depois de começar a terapia, o mundo entrou em uma quarentena infinita, e eu me beneficiei MUITO como esse tempo. Óbvio que 2020 foi um ano muito triste, bizarro, assustador, frustrante… mas eu decidi usar o tempo que 2020 me deu para me recuperar. Para me entender, e entender essas pessoas que me causaram tanta dor.
Na terapia entendi que as pessoas que fazem bullying, os famosos valentões, são na verdade as pessoas mais tristes e desesperadas do local em que se encontram. Entendi que nunca me defendi por sempre procurar o melhor na pessoa, por ser uma pessoa empática, e sempre dar uma desculpa para justificar os atos dos outros. Entendi que eu não consigo “concertar as pessoas”, e que todos nós temos problemas e traumas, mas nada justifica jogar sua bagagem no outro, como fizeram comigo. Entendi que não é preciso perdoar alguém para seguir em frente, é possível deixar o passado no passado, aprender com os acontecimentos e evoluir para o futuro. Aprendi que quem descarrega tanta negatividade e ódio nos outros sente tudo em dobro por si mesmo.
Hoje não publico esse texto para me vitimizar. Hoje eu publico esse texto para contar a minha história do jeito que ela deve e merece ser contada: por mim. Só eu sei o que vivi, só eu sei o que senti, só eu sei o trabalho que me deu para chegar até aqui. Não foi fácil, mas foi necessário. Tenho muito orgulho de mim, da pessoa que me tornei, da jornada que tracei, da maneira que lidei com tudo. Hoje eu publico esse texto para deixar no passado toda a dor e sofrimento, e levar para o futuro todo o aprendizado. Depois de tudo que eu vivi, me tornei uma mulher mais prudente, confiante, feliz, experiente e empática. Muito mais que isso, eu publico esse texto porque eu mereço.
Não estou dizendo que hoje em dia não passo pelos mesmos problemas, até porque mês passado mesmo eu me afastei de 2 pessoas pelos mesmos problemas… Estou dizendo que hoje em dia eu sou mais forte e preparada pra lidar com esses problemas. E que eventualmente vou chorar para a minha psicóloga dizendo que ‘não aguento mais’. Vou fazer o que?! Não sou de ferro.
E para todos que fizeram bullying comigo, aqui vai meu recado de humano para humano: eu realmente – do fundo do meu coração – espero que você consiga ser feliz, que consiga achar alguém para amar, que você seja alguém bem sucedido, e que consiga se sentir confortável para procurar ajuda e curar todas as feridas dentro de você. E, se um dia você criar consciência de tudo que fez, consiga se perdoar e seguir em frente. Mas, independente de qualquer coisa, te desejo muito amor, sempre.
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